Venho, por meio desta, informar aos colegas, que chegou pelo
correio a minha carta de aposentadoria. Não sem tristeza, informo a todos que,
mesmo na minha condição de professora, não poderia mais fazer parte dessa Instituição.
Não reconheço esse tempo, os diálogos e os quiproquós todos. Mas desconheço
mais ainda a mim e aqueles com quem partilhei mais de 30 anos de sala de aula.
Como dizem os mais sabidos, sou outsider,
estou fora de moda, do tempo, do lugar, estou fora.
Não sou da geração que sabe fazer uso do e-mail, mas as cartas,
que coletava na minha caixinha de correio, sempre tiveram uma dimensão mágica
no meu cotidiano, era o momento de aguardar palavras queridas, notícias dos
meus que estavam longe, promessas de reencontro, enfim, de toda uma escritura
permeada pelo mais afetivo. Mas as cartas também não existem mais, não tem mais lugar nesse presente. A minha caixa
está enferrujada, talvez ela também tenha decidido se aposentar, meio a contragosto,
já que não mais foi coletada ou untada em suas juntas. Talvez, assim como eu,
ela tenha se ressentido da última recebida.
No passado, agora diluído pela dor despedida, sempre tinha
desejado que esse dia chegasse, principalmente, naqueles momentos em que minhas
pernas não acompanhavam mais a ligeireza das minhas vontades. Costumava dizer,
em gracejos, que os dias que faltavam estavam sendo marcados, na minha agenda
particular, como quem faz a contagem para uma viagem à lua. E, hoje, estou na
lua, como a figura de um astronauta na imensidão do seu território. Apenas eu e
essa terra que deixei para trás.
Nunca pensei que fosse tão doído. Nunca pensei que tão
rapidamente compreenderia que ninguém é insubstituível. Talvez, finalmente, tenha compreendido a marca desse presente, pois esse é o presente da ligeireza, de tempos
que corroem tudo, que plastificam os recursos, que desmantelam os desejos, que
impedem a passagem tranquila, confortável.
Mas quero dizer a todos vocês, aos antigos e aos novos colegas, com
essa minha despedida, já que toda carta precisa ser correspondida, como aprendi
nos tempos idos, que estou aqui, disponível, para o que precisarem de mim. É o
que eu espero, ainda que saiba, pela minha experimentação simultânea do tempo,
que não o será.
Saudações acadêmicas,
Cordélia.
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